sábado, 18 de outubro de 2008

anti-poesia II

Chego atrasado. Ao acordado, para variar. Ela de cara e corpo virado, sem lado, nem perfil, toda ela canil. Não cadela. Canil: Abandonada, maltratada. Insultada: Pelas palavras que eu não lhe disse e por isso Acho que zangada. Aliás, atraiçoada, por lhe ter sido prometido um príncipe e lhe ter saído um sapo. Por outras palavras, foi-lhe prometido um vestido -de noiva- e coseram-lhe um trapo. De lã. Mas de qualquer maneira um trapo. Lá está ela; abandonada, maltratada. Insultada. Nada cadela. -Canil. E no entanto, assim que chego, grita. Uiva!, tenta magoar-me com as palavras que não diz. Morde-me. Baba-se até. Dos olhos. Terá apanhado raiva? Daquela que se pega daqueles que a tem por não ter. Agora chove. E ela chora. E eu ali, -apático-, a tentar perceber porque será que sempre que chove durmo de janela aberta; porquê que a goste de ver chorar; de a ver sofrer; de a ouvir gritar? e descubro que por incrível que pareça, não gosto. talvez para alguns faça algum sentido, visto que gosto dela, mas para ela o vestido todo ele é trapo; de lã. Mas trapo.

O príncipe há muito que se transformou em sapo; quem sabe com o primeiro beijo. E o vestido todo ele é remendos. Um trapo de repetições e remendos. E ela ali. Canil. Não cadela. Canil: -Abandonada e maltratada e insultada e zangada e atraiçoada.

Ele há dias em que me sinto um cão. Sem osso. No canil.

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