quinta-feira, 28 de dezembro de 2017



Nada mais há a dizer, o escuro lá fora e as mensagens no telefone, a música nos auscultadores, a mesa da cozinha, o bater das ondas do mar, a janela embaciada, o tremer da tua voz, uma e outra vez, quando tudo o que costumava ser, é. Nunca mais sairás, desta caixa, melhor, gaveta, com correntes fechada. Vou dizer-lhes que foste viajar, que esperaste por todos mas ninguém ouviu o teu grito: como um maestro que toca numa sala, só, porque ninguém veio. E ele toca, não feliz, nem triste, apenas toca.
Tira esse sorriso da cara e cola-o ao coração. Talvez ele aceite as tuas mentiras de furacão. Vontade de peras, trincadas pelas aves, corvos nus. A ser julgado, apenas por mil juízes, todos cegos e mudos. Só eles poderiam sentir, melhor do que ninguém, a imensidão do vazio que todos reclamam ver.

Eu agradeço o que não aguento sozinho, sem armas nem inteligência, sobra-nos apenas uma consciência no limbo, que tudo sabe; e nada perdoa. Meramente um todo de partículas, no fim, assim como no inicio. Não há tempo que traga a tempestade tão desejada, nem céu que nos salve de um mundo insaciável. Sem alma, restam apenas uns dedos - sem unhas, apenas as redes que te aparam a queda levar-te-ão aonde deves voar. Não há ruas, somente becos, todos com uma única e a mesma saída. Um olho enorme, por baixo, mostra-te a esfera de uma veracidade flutuante. Queres saber como acaba? Basta nadares por entre as Meridianas. Elas são as irmãs incestas de uma vida completa. Só um amor de cão nos pode salvar de uma vida inútil.

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