quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Meio-Metro


Estou feliz. Para não variar. A novidade reside no facto de transcrever essa mesma felicidade para este espaço. Querido. Este assombro de sentimentos não é prova de nada em especial. Apenas que hoje acordei e senti que o mundo era meu para conquistar. E que era eu quem o tinha de velejar. Apesar do frio exterior veio-se-me um valor intenso ao interior: inédito. Consequência -ou não- da minha consciente impotência perante algo que não posso mudar, resta-me com ela desenhar. E soltar. Esta gargalhada provem da manada de olhares aos pares que passam por mim todos os dias sem me conhecer mas que no entanto se recusam deixar de espreitar. Nada a-ver. Esta magnitude simplória de acontecimentos provém do elementar motivo de -ela- me ter abordado no metro, sem nunca me conhecer, apenas por ser admiradora do que eu ouvia: alguém que encantara gerações fazendo rodopios, qual piões no recreio movidos a fios. E pelos visto ainda en-canta. Pelo menos a dois. E ali ficamos nós, dois desconhecidos unidos desde sempre por um som mudo sumido em apenas duas estações. Querido. E o número caído no banco onde estivera o seu ouvido. Que gentes as nossas musicais mentes. A anos de luz de perceber o que me faz combater, continuo com uma vontade imensa de me preencher. E não é que de vez em quando lá leio, oiço, vejo, toco, -sinto- qualquer coisa que me faz sim, crer.

Enquanto escuto o que me é escrito do além, leio nos abstractos a nitidez daquilo que me faz bem. E por isso mesmo continuo a rastrear tudo o que de infalível me fora dado enquanto estudado. Muito obrigado.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Antes de Mais


Dois assuntos. Porque não me apetece escrever duas vezes, escrevo só uma. E mal. Desfocado.

-Disse-lhe que não me importava com o que os outros pensam de mim

Leia-se que quando digo -outros- falo daqueles que não conheço ou, mesmo conhecendo, não admiro e por defeito não respeito
.Sim, são esses os "meus" outros

-Disse-me que não acredita

A resposta era óbvia, mas por alguma razão eu não estava à espera dela. E por isso não tinha qualquer resposta preparada. Como em tantas outras ocasiões.

-Ainda bem, pensei em voz baixa. Foi da maneira que fui o mais sincero possível. Comigo, não com ela. Comigo porque quando cheguei a casa decidi prová-lo. Não porque precisasse que ela acreditasse. Entenda-se:

Precisava de acreditar em mim. Precisava de voltar a dar tudo por mim, dar tudo por aquilo que acredito e acho como justo. E bom.

Por isso decidi começar por algo simples. Isto.

E decidi deixar de escrever bonito, daquilo que menos gosto. Decidi começar a escrever sem apagar, sem pensar, demais, decidi tentar afastar os outros com a realidade. Nua e crua. Pois, A realidade.

Passado algum tempo, alguns textos, -disse-lhe

Á primeira vista parece que provei a minha tese. Quem entrasse cá viria uma página às cegas, um monólogo quase. Ali e aqui, uma observação. Nada mais. Mas o fluxo aumentou. Apesar de nada dizerem, ficaram mais; lerem mais; estudaram mais; compararam mais e depois hesitaram mais.

-Nada como entrar e sair como se nada fosse, para não os identificarem com a demência cá presente. Mas houve algo que os fez ficar, pelo menos mais um bocado. Mesmo que depois tenham saído com um pouco de mim.

A conclusão, na minha visão

-Podemos escrever para impressionar, mas só nos conseguimos tocar quando nos expomos a'fundar. Não é o mais bonito? Que se foda (desculpem a linguagem), para beleza basta-me não racionar - Sentir - Tocar

...

Depois disse-me, -Porquê que só escreves sobre tristeza se nos teus olhos vejo felicidade?

-De certeza, perguntei ao responder.

Passo a redimir-me ao explicar o porquê do meu pesar. Não o faço para impressionar, para isso bastaria rimar. Como podem constatar - apesar de me acabar em ar.

Devo escrever que não o faço por me sentir culpado, amaldiçoado ou de alguma forma azarado.
Faço-o por uma simples consideração: Não consigo explicar a lua que sinto mais minha que tua; Não consigo explicar a chuva que caí e bate na janela e me adormece qual beijo de Cinderela; Não consigo explicar o amor que todos os dias sinto vindo Daqueles que com os olhos me vêm a alma de vento.

-Como posso explicar aquela folha que me fez parar dez minutos sem conseguir avançar; Como posso explicar que apesar de tudo o que vejo, apesar de tudo o que invejo, apesar de tudo o que desejo, passo o dia a sorrir a acreditar piamente que sou feliz sem tentar; Como?

A resposta vem pegada à pergunta: Não posso, apesar. E ainda bem, porquanto ser racional, ao matutar do porquê de o ser, de o fazer, de o sentir, de o sorrir, de o iludir, nunca mais poderia ser-me todo sem desgostar do que estava a avistar.

Portanto, -raciocino, na preguiça matuto, penso, contabilizo, pergunto; em suma de tudo vasculho. No fim o manuscrito é como um assassínio, sem justiça astuto, tenso, lacrimejo, respondo; transcrevo o meu lagar de entulho.

Liberto-me! Mas não me carecia fundamentar, não fosse o facto de o espectáculo estar a terminar, pelo menos até voltar a tal vontade -de vomitar. Sem chorar. Palmas.

sábado, 18 de outubro de 2008

anti-poesia II

Chego atrasado. Ao acordado, para variar. Ela de cara e corpo virado, sem lado, nem perfil, toda ela canil. Não cadela. Canil: Abandonada, maltratada. Insultada: Pelas palavras que eu não lhe disse e por isso Acho que zangada. Aliás, atraiçoada, por lhe ter sido prometido um príncipe e lhe ter saído um sapo. Por outras palavras, foi-lhe prometido um vestido -de noiva- e coseram-lhe um trapo. De lã. Mas de qualquer maneira um trapo. Lá está ela; abandonada, maltratada. Insultada. Nada cadela. -Canil. E no entanto, assim que chego, grita. Uiva!, tenta magoar-me com as palavras que não diz. Morde-me. Baba-se até. Dos olhos. Terá apanhado raiva? Daquela que se pega daqueles que a tem por não ter. Agora chove. E ela chora. E eu ali, -apático-, a tentar perceber porque será que sempre que chove durmo de janela aberta; porquê que a goste de ver chorar; de a ver sofrer; de a ouvir gritar? e descubro que por incrível que pareça, não gosto. talvez para alguns faça algum sentido, visto que gosto dela, mas para ela o vestido todo ele é trapo; de lã. Mas trapo.

O príncipe há muito que se transformou em sapo; quem sabe com o primeiro beijo. E o vestido todo ele é remendos. Um trapo de repetições e remendos. E ela ali. Canil. Não cadela. Canil: -Abandonada e maltratada e insultada e zangada e atraiçoada.

Ele há dias em que me sinto um cão. Sem osso. No canil.

anti-poesia

Descubro que por mais forca que faça, acabo sempre por encontrar uma traça, uma farsa, que se me entranha pela pele adentro. Sem papel de destaque, é apenas figurante. Sem Channel; adoçante. Dito isto e visto não haver plano previsto, começo a imaginar o que seria de mim sem o dito Evaristo:
O tipo da pergunta, -tens cá disto?

-É o riso que me leva de um lado par o outro sem procurar o que encontro-.

Tinha três anos, três anos. A primeira vez que me lembro daquele pedaço de mundo, sem fundo, no fundo de tudo em que me afundo.

A discussão: não sei a razão, mas suponho que fosse devido aquilo que lhe era mais importante que pão. Sim; falo do meu papão, dos momentos em que chegava a casa e ladrava que nem um cão, e eu a brincar. Porque não o ouvia. As suas palavras nunca me causaram medo nem tão pouco inspiração, apesar de não me lembrar de uma vez sequer me ter levantado a mão. O papão. -Engraçado como este adjectivo só me aparece quando já não tenho idade para chorar em vão-. Até àquele dia. Os vizinhos saíram das suas comportas, para assistirem às palavras tortas. Não percebo o que se passa, vejo desfocado; ou será a memória a tentar esconder-se de mim. As palavras saem de um lado e de outro de uma forma habitual, fará parte do ritual? A minha protectora, outrora professora, levara-me ao colo, porque as minhas finas pernas já não aguentavam mais solo. e de repente PÁS! Um estaladão,

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Muralha


É difícil ser descomplicado quando a mente está confusa. É difícil perceber todos os sinais quando não nos percebem os nossos. É difícil acreditar quando tudo nos leva ao ponto inicial da criação humana. Primatas. Somos afinal todos. Fazemos parte de um pequeno mundo perdido no espaço. Sem tempo.


Todos queremos andar para trás, como se não soubéssemos o que estamos a fazer. Sabemos.

E muito bem. Apenas não queremos ver, queremos viver, -sonhar- mas nem sequer nos deixamos adormecer. Repetimo-nos a cada palavra gasta.


Não podes esperar de mim aquilo que não me corre nas veias. Sou um simples ateu das vidas e não, não quero que me leias. Quero que saías.


Mas se me sinto viciado, até duas palavras me fazem perceber o dia. Mas sinto que devo calar.

Porque o que saí não é o que quero dizer. Explicar o que estou a sentir. Não. Não. Não consigo. Que prisão me escorre pela mão. E que bater. Será o papão. Buh. Sim, é o coração.


Que calor. E no entanto, tremo. Gemo. Esqueço-te. Sei que sim. Mas não me lembro quando.

Há de chegar o dia em que me faltam as palavras e aí sentirei o que é ser livre destas escravas.


Aqui. Tudo é noite e o dia passa sem mim. Que felicidade me poderá trazer partir se só de o imaginar já me está a baralhar. Desculpas. Aceites. São minhas e são para mim. O resto do mundo ficou sem alecrim. Sem ser semeado. Menos dourado. Eu fico apenas com o pensamento que um dia terei tudo aquilo que recebo mas não percebo. Porque vejo tudo para além do que é e nada daquilo que me está exposto.


Sinto-me crente, mas depois vêm as palavras e foco sem lente. Perco-me. Será que alguma das coisas que disse chegaram. Porque eu, não as ouvi sair.

domingo, 5 de outubro de 2008

No geral


Às penso em ti e tenho saudades. Não te ti em particular, no geral. Tenho saudades. Penso, lembro-me de ti e de tudo o que passamos e sinto no peito aquela palavra que existe unicamente no português.


Isto tudo sem nunca querer voltar atrás. Porque já não te amo. Minto. Desejamos sempre no nosso secreto eu, voltar para trás para aquilo que nos fez feliz. -O que quis dizer não foi isso-.


Por outras palavras: não me arrependo de praticamente nada daquilo que passei contigo.Por isso recordo sempre aquilo que me fez sorrir. Sim.


Como sei que algo assim não dura para sempre, prefiro ser contente por pelo menos alguma vez o ter sido, do que me martirizar por não mais o ser. Contigo. Porque o sou, comigo.


Mas tudo é diferente, agora as coisas são a preto e branco. Simples.

Connosco também eram, nós é que as pintávamos de outra cor.


No nosso tempo, tudo era arco-íris e, por mais que queira, não consigo crer que alguma vez mais o será.

Tenho a certeza que voltarei a ser feliz. Mas desta vez no sintético, a preto e branco, sem muitas estórias, sem potes de ouro no final.


Lembrei-me disto porque dá-me a volta à mente a mente humana:

Tão desumana. Connosco mesmo.

Continuo a procurar a razão que nos faz fazer algo:

Evitar a felicidade.

Parecer procurá-la mas na verdade evitá-la, sentir-se seguro no seu oposto. Então finge-se ser feliz, finge-se tentar ser feliz e na verdade:

Não se é.


De tanto pensar dói-me o peito, pois nunca encontro uma razão, porque procuro-a sempre na lógica. E o sentimento na a usa. Fá-la brinquedo, goza com ela e reduz-a a nada.


Simplesmente porque te vejo procurar a felicidade. Encontrá-la, fugir dela a sete pés.

Abrigares-te à chuva e sentires-te seca. Por dentro.


“-Mas pelo menos”, pensas tu: “-tou segura”.


E rezo tanto, -rezo mesmo-, para que esteja errado. E como dizer isto: não estou.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Faces


Parte II

Sou um. Não sou nenhum.

Sou a mistura daquilo que me tornaram

E daquilo que me transmitiram

E daquilo que me é inato: Sou.

O que tenho e o que me deram e o que negaram


Eu sou um pouco de mim

Mas essa parte está tão escondida

Está tão recôndita do meu ver da vida

Que nunca chego a pensar no seu fim


Num mundo em que actos são condenados

E pensamentos são de bom grado passados

Continuo a pensar que nada daquilo que somos

É na verdade o que de nós nas lendas nos contamos


Faço portanto uma síntese do tudo e do nada

Porque não sou nada por inteiro

Sou um pouco de todos, dos bons e maus

Dos delinquentes e dos crentes, dos cegos e dos videntes


Leio tudo o que se escreve e no entanto sou analfabeto

Para ver é preciso antes de mais fechar os olhos e perceber

Que os sentidos servem apenas para confundir e esconder

O erro que se esconde por detrás do já desvendado secreto


Acredito portanto que nunca existimos por completo

Somos miragens daquilo que sempre imaginamos no feto

Que acaba por nascer e apodrecer por não ter o que escolher


Quem irá ser: Alguém influenciado a impressionar sem crer

Fica então a pergunta que não me consigo responder

Posso eu alguma vez viver sem me ver lentamente morrer?

Depende: Se a minha vontade for ficar no coração e não na mente

Posso permanecer para sempre sem nunca me pesar nascer


Serei portanto um pouco de tudo o que desejo querer

Sou um por junção de todos os que me fazem a alma

Nenhum por inteiro pois sobra-me o vazio de novos seres.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Faces



Parte I


Custa me escrever cada vez mais, já que de dia me leio e de noite esqueço, sendo que me penso durante segundos que tais, momentos de clareza que me fazem depois do avesso.



Mesmo assim já pensei o que aqui ponho

E com temas pré-definidos não consigo sonhar

Deixar escorrer as palavras para ficar livre de arranhar

Quando explico o que a certa altura já esqueci no sonho




Acredita-mo-nos ser aquilo que vemos

Serão os outros aquilo que vemos deles?

E serão eles aquilo que navegam de si sem remos

Ou viveremos todos numa bola de sabão sem lemes.


Não me explico.

Mesmo que explicasse com uma lupa

Ficariam sempre com uma impressão minha de camada fina

Não me importo.

Pois só quem me conhece me preocupa

Mas no final das contas também eles não me lêm a sina


Quantos sou então:

Pergunto? Não sei responder

A resposta saí-me sem questionar ou sequer se importar

Sou aqui meu mestre em escravo sem ensinar

só aprender.


Tudo o que nos torne algo faz-nos diferentes

Seremos portanto nunca ninguém. Porque mentes?

Fomos sempre alguém na junção das gentes iguais

O sentimento de pertencer faz-nos perseguir materais correntes


Quantos somos:

Algo serei porque como disseram, pensei.

Tudo não serei pois não perguntaria o que não sei

Algo fica portanto como hipótese para determinar a lei


Aquilo que somos amargura aquilo que fomos

Benaventurados alguns pois nem tudo comemos

Acreditamos no manto do crer em algo não profano


No entanto antes d’outros é a nós que amamos

Sem essa capacidade não nos existiríamos sem amos

Ainda assim lemos algo do extraordinário engano.


Impossível definir-te sem que me julgues fingir-te

Faço portanto a minha escultura dormente e mental

Daquilo que vejo de mim e de ti sem ti nem mim

Porque aquilo que nos imagino não é bem assim


Quem sou e quem és:


Não sei.


Seremos o que imaginamos de nós

A ideologia de viver em cordas sem nós

A destreza de não dizermos bem o que queremos

Será que nos faz falta a palavra e a coragem na voz

As duas sem colagem por medo do julgamento a vós –oremos-


Somos todos um pouco daquilo que somos

Por vezes um pouco mais um pouco menos

Aquilo que retratam de nós em quadros a nus

Ou seremos aquilo que vêm de fora sem luz.


Serei eu aquilo que demonstro de mim

Serei eu aquilo que querem que seja de mim

Serei eu aquilo que imagino ser de mim

Serei eu aquilo que os outros vêm de mim

Serei eu aquilo

Serei eu

Serei?

Sou.